segunda-feira, 05 outubro 2015 17:43

Jorge Jordão em entrevista: "O consumidor está no centro das preocupações da APED"

Acentuar a sua vocação customer centric. Esta é uma das prioridades da nova direção da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), liderada por Jorge Jordão, em representação da Jerónimo Martins. Uma prioridade que se manifestará na defesa de políticas que promovam o aumento do poder de compra das famílias, ao mesmo tempo que a melhoria do tecido económico que a associação representa. Afinal, os 131 associados são responsáveis por uma faturação que corresponde a 11% do PIB português.


Store | Quais os desafios de liderar a associação no atual contexto do País?
Jorge Jordão | A APED é hoje uma entidade de relevo no contexto do setor e no próprio contexto nacional, tendo desenvolvido um trabalho com resultados comprovados. A direção eleita vai pugnar pela criação de condições que possam beneficiar os consumidores e as empresas. Para isso, estamos fortemente empenhados no diálogo e na colaboração com todos os stakeholders.
Nas eleições submetemos a sufrágio um programa do qual constavam cinco linhas de orientação estratégica, a primeira das quais passa por ampliar o share of voice da associação na opinião pública, promovendo o seu posicionamento junto dos consumidores e dos demais stakeholders.
Iremos também contribuir para a eficácia dos processos legislativos e para a simplificação da legislação, tendo em vista a sua aplicabilidade e o impacto no setor. Além disso, procuraremos alargar o espetro de atuação da APED, refletindo a influência de todos os setores nas grandes discussões dos temas económicos do nosso País, nomeadamente quanto ao rumo que a economia deverá trilhar.
E, por último, mas não menos importante, iremos promover a APED enquanto representante do setor, assumindo a universalidade dos canais utilizados na sua relação com o consumidor, a tecnologia está continuamente a proporcionar novas possibilidades de contacto e uma associação como a nossa deverá estar sempre na linha da frente na utilização desses canais.

Store | Em que se sentido se propõe a direção ampliar o share of voice da direção?
JJ | Nessa ampliação do share of voice, iremos, não apenas promover os interesses dos nossos associados, mas acentuar a nossa vocação customer centric. Somos uma associação que tem no cerne das suas preocupações o consumidor, que, no nosso País, é mutas vezes esquecido. Há muita legislação que é produzida sem uma representatividade do consumidor efetivamente notória. Mas o consumidor é o núcleo das preocupações da distribuição, pois somos o elo de ligação com os produtores, tornando mais cómodo e acessível o acesso aos bens. Esse é o papel da distribuição moderna.
É claro que o nosso trabalho é norteado pela defesa dos interesses dos associados, mas olhando para o consumidor como o centro das nossas preocupações e pugnando por políticas que se traduzam numa melhoria do poder de compra das famílias e numa melhoria do tecido económico que representamos.

Store | Outra das prioridades deste mandato prende-se com a eficácia do processo legislativo. Esta é uma preocupação em linha com o estudo sobre os custos da burocracia que a associação apresentou recentemente?
JJ | Sim, insere-se na temática dos custos de contexto. Os investidores são atraídos por espaços económicos em que esses custos sejam pouco significativos e, infelizmente, Portugal ainda não é um bom exemplo. No estudo sobre os custos da burocracia a nível público procurámos aferir quais eram os custos associados à redundância das informações e, em última análise, ao facto de não se poder responder uma única vez para uma base de dados comum à qual pudessem aceder os diferentes organismos do setor público. Dentro dos meios disponíveis, e atendendo às limitações decorrentes do número de respostas, foi possível, mesmo assim, concluir que cerca de 4 milhões de euros são desperdiçados em tempo consumido no preenchimento de relatórios, repetidos e sem qualquer valor acrescentado. As empresas são sistematicamente penalizadas com desperdício de tempo e de recursos. É um peso extraordinariamente significativo, que é preciso reduzir drasticamente.

Store | Precisamos de melhores leis, mas também de menos leis?
JJ | Temos, reiteradamente, transmitido essa preocupação, sempre norteados pela necessidade de redução dos custos de contexto. Continuamos a ter uma economia gravosa do ponto de vista dos custos de contexto e também uma economia cuja legislação é, de certo modo, imprevisível e está em contínua mutação. É o caso da legislação fiscal. É um dos problemas centrais da nossa economia e pouco se tem feito nesse domínio, quando este processo de simplificação legislativa, de previsibilidade do quadro legal é muito importante para atrair o investimento.
No Parlamento, há uma unidade técnica de apoio orçamental, por que não ter uma unidade que zelasse pela simplificação legislativa? Um pequeno órgão dotado de pessoas particularmente especializadas, preocupadas e ocupadas com a avaliação do impacto das leis. Seria muito importante porque, com a profusão de diplomas que existe, torna-se muito difícil ter um índice de governabilidade aceitável. Numa sociedade moderna, isso não é admissível.

Store | A propósito de legislação, a fiscal é uma das que mais afasta os investidores. Qual é a posição da APED?
JJ | A posição da APED nesse domínio é muito clara: somos a favor da diminuição do IVA e da Taxa Social Única. Entendemos que o País já está muito sobrecarregado de impostos e que nem os consumidores, nem as empresas podem continuar a viver com essa carga fiscal. Atingimos – diria até que ultrapassámos – aquilo que é entendido como uma carga fiscal admissível na sociedade moderna.
Há que fazer reformas e essas reformas devem ser tendentes a reduzir o peso do Estado na economia, de modo a que o Estado seja cada vez mais regulador e menos interventor. Essa transição não está a acontecer ao ritmo desejável.

Store | A que atribui a dificuldade nessa transição do papel do Estado?
JJ | Penso que deriva, fundamentalmente, da evolução política ocorrida nas últimas décadas. O Estado dominava fatias largas do tecido empresarial, de tal forma que ainda há poucos anos tínhamos o Instituto das Participações do Estado... Pensava-se que, com um intervencionismo intenso e com o Estado transformado no investidor por excelência, os nossos problemas económicos seriam resolvidos. Mas a realidade veio demonstrar que não. O Estado deve estimular a iniciativa privada, não substituir-se-lhe. O Estado não é um empresário e não se pode assumir como tal. Mal de nós quando esse papel se agiganta – isso significa que a economia estagna, acaba por perder competitividade e, mais cedo ou mais tarde, é confrontada com graves crises.

Store | Estamos a sair de uma dessas crises? Do ponto de vista da distribuição, a retoma está a acontecer?
JJ | Sem dúvida que estamos a sair de um período mais agudo, em que fomos forçados a recorrer a ajuda financeira e tivemos de nos submeter a um plano de ajustamento macroeconómico intenso e dolorosa. Neste momento, enquanto devedores, a nossa credibilidade melhorou face aos credores e foi restaurada a confiança que é indispensável para o País. Mas o relançamento da economia de uma forma sustentada ainda não ocorreu. Há sinais positivos, mas de forma sustentada essa retoma ainda não existe. Dando como exemplo do setor da distribuição, só em fevereiro último, e segundo dados do INE, saímos de uma situação de deflação a nível dos produtos alimentares. Este fenómeno era inédito entre nós. Conhecíamos muito bem a inflação, mas não a deflação. Mas, ao longo de 2014 e até fevereiro deste ano vivemos, a nível deste subsetor, numa situação de quebra de preços.
Não podemos, porém, ser alheios ao que se passa na União Europeia, que tem metade do crescimento potencial dos Estados Unidos (oscilando entre os 2,5% e os 3%). Os países que integram a União enfermam de uma certa anemia do ponto de vista do crescimento. O plano Juncker visa ser um forte estímulo para esse crescimento e esperemos que se concretizem os objetivos anunciados, mas há muito a fazer para que este espaço económico seja vibrante.

Store | Diria que a distribuição moderna lidou bem com a situação económica dos últimos anos?
JJ | O setor demonstrou uma resiliência notável nos últimos tempos, respondendo ao fenómeno da deflação de uma forma saudável e positiva, procurando minimizar o impacto de forma a não se refletir numa quebra do nível de atividade e a não obrigar a reajustamentos na estrutura, nomeadamente despedimentos. O setor resistiu sempre, apostou no desenvolvimento da atividade, ainda que pressionando, obviamente, as suas próprias margens. O que nos preocupa agora é que haja relançamento da economia de uma forma sustentada.

Esta entrevista pode ser lida na íntegra na edição impressa da Store Magazine.

fs@briefing.pt

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