2018. Portugal não é o mesmo de 1991. A população empregada no sector primário desceu, passando dos 17,5%, em 1991, para 6,9%, em 2016. No sector secundário, no mesmo período, diminuiu de 33,5% para 24,5% e, no terciário, subiu dos 49% para os 68,6%. Portugal transformou-se, crescentemente, num país de serviços: 76% do PIB têm origem no sector terciário.
Se acrescentarmos a estes números tudo o que sucedeu – e está a acontecer – na área das tecnologias de informação, dos hábitos de consumo e do desenvolvimento de conceitos como o big data e a inteligência artificial, concluímos que a economia portuguesa mudou e mudou muito.
Aliás, foi o próprio paradigma económico-empresarial que se alterou: a maior empresa de comunicação do mundo não tem uma só infraestrutura de telecomunicações: Skype; o retailer com maior valor do mundo não tem inventário: Alibaba; o maior abastecedor de filmes do mundo não tem uma só sala de cinema: Netflix; o maior fornecedor de táxis do mundo não é proprietário de um só táxi: Uber; a maior rede de publicidade do mundo não produz um só anúncio: Google.AdSense; a empresa de media mais popular no mundo não cria um só conteúdo: Facebook; o maior provider de alojamento do mundo não tem um só hotel: Airbnb. E todas estas empresas têm outra coisa em comum: estão à distância de um simples click!
Um problema de falta de representatividade
Apesar destas transformações e quase 30 anos depois da sua criação, a composição da Concertação Social permaneceu praticamente inalterada. Qualquer nova entrada só poderá acontecer, do lado das confederações empresariais, com a anuência das quatro que a lei impõe – CAP, CCP, CIP e CTP – o que, desde logo, implica uma certa submissão de quem pretende entrar relativamente a quem já lá está, com a evidente perda de autonomia estratégica e de acção; e do lado das confederações sindicais, também só se a CGTP e a UGT o permitirem é que uma nova entidade terá ali assento. Portanto, para mudar o status quo é preciso mudar a lei!
Cruzando a evolução da economia com a composição da Concertação Social portuguesa, a conclusão é evidente: há um problema de falta de representatividade! Senão, vejamos: é desejável que sectores como os da grande distribuição, dos centros comerciais, das tecnologias de informação e do comércio eletrónico, estejam fora da Concertação Social? Que as telecomunicações, os transportes expresso, a segurança privada e as agências de meios, não integrem a Concertação Social? É compreensível que permaneçam fora do diálogo social institucionalizado sectores como o da construção civil e imobiliário? Ou o das sondagens e estudos de opinião e de mercado? E, do lado sindical, é aceitável que sindicatos independentes, com o dos quadros técnicos e bancários à cabeça, estejam ausentes da Concertação Social portuguesa?
Não será também por isso que, em conformidade com os resultados da primeira edição do Barómetro Economia e Empresas da CSP, divulgados em julho p.p, quase metade das empresas desconhece a eficácia dos sindicatos (47%) e também das associações empresariais (41%)?
A presente falta de representatividade exige, portanto, uma reconfiguração da Concertação Social portuguesa. A única forma de a suprir é, como vimos, alterando a lei. Essa mudança pode ser despoletada pelo Governo ou pelos grupos parlamentares e estimulada a priori ou a posteriori pela Presidência da República.
Necessidade de uma nova resposta
Se o atual ciclo político se cumprir, em outubro de 2019 ocorrerão eleições legislativas. Como o mandato do CES termina com a eleição do seu novo presidente – que decorrerá da nova composição da Assembleia da República –
, abre-se, agora, uma boa oportunidade para repensar o atual modelo de Concertação Social que temos em Portugal. E os partidos, que estão precisamente agora a iniciar a elaboração dos seus programas eleitorais com que pretendem apresentar-se a eleições, têm, por isso, uma boa razão para reflectir sobre o assunto.
Se, como nós, concluírem pela necessidade de uma Concertação Social institucionalizada mais útil, pois que seja proposta uma nova resposta. Uma nova resposta que vise contrariar a muito frágil cultura de compromisso existente e solidificar o diálogo social institucionalizado; que tenha presente que inviabilizar compromissos em sede de Concertação Social tem por consequência conferir mais poder efectivo ao Governo e à Assembleia da República; que seja inclusiva e, portanto, permita – uma vez demonstrada a sua dimensão e representatividade – a integração praticamente automática das várias entidades na Concertação Social institucionalizada; e que aceite o diálogo social tripartido – Governo, Confederações Empresariais e Confederações Sindicais – como um valor intrínseco em si mesmo e um factor fundamental para a concertação de interesses e de posições eventualmente antagónicas.
Em suma, uma nova resposta que defenda uma Concertação Social forte, que funcione independentemente das pressões político-partidárias e se desenvolva de forma genuína, transparente e conclusiva.
A missão é, assim, clara: promover uma reforma simples, adequada às novas exigências e capaz de responder aos novos desafios económico-sociais. Com uma enorme vantagem: a de não ser preciso rever a Constituição da República Portuguesa para que seja conseguida uma reforma útil da Concertação Social. Reconhecida a sua falta de representatividade actual, o que é preciso, a condição suficiente para que seja bem-sucedida, é supri-la; a condição necessária é vontade política para mudar a lei.
Quase três décadas volvidas sobre a institucionalização da Concertação Social em Portugal é, pois, tempo de acrescentar. De acrescentar representatividade e de acrescentar novas ideias - de ir ao encontro da História. Por se tornar mais abrangente, mais inclusiva, mais representativa, maior, a Concertação Social institucionalizada não se torna, por isso, menos influente, nem perde, por isso, capacidade de intervenção própria. Pelo contrário, tornando-se completa, enriquece as suas posições, passa a ser mais ouvida e o que disser passa a ser mais considerado. Numa palavra, ganha em credibilidade, prevalece.
Martim Borges de Freitas, secretário-geral da Confederação dos Serviços de Portugal (CSP)
Fonte: Store