“Apoiar a Ucrânia durante o tempo que for preciso face à guerra ilegal de agressão da Rússia. (…) Coordenar a nossa abordagem à segurança e resistência económicas baseadas na diversificação e aprofundamento de parcerias e em ‘de-risking’ [mitigação de riscos], não ‘decoupling’ [distanciamento gradual]. (…) Fomentar uma recuperação económica global forte e resiliente, manter estabilidade financeira e promover emprego e crescimento sustentável.” Comunicado de Líderes do G7, Hiroxima, 20 de maio de 2023, ponto 1.
A Cimeira do G7 deste ano é bem reveladora dos desafios actuais que o mundo enfrenta, bem como de algumas dinâmicas ou tendências que nos vão acompanhar nos próximos anos. À cabeça, duas realidades: a Guerra russa na Ucrânia e a necessidade de “diversificar”, “mitigar” e “fomentar” as nossas economias.
Em relação à primeira, podemos destacar a força da unidade entre os países deste Grupo, nomeadamente, a França, a Alemanha, a Itália e o Reino Unido, o Japão e, do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos da América (EUA) e o Canadá, aos quais se junta a União Europeia (UE). Um dos maiores impactos da Guerra tem sido a mudança clara do que a Rússia de Vladimir Putin representa em termos de ameaça. Se tivesse de escolher um país como barómetro seria, sem qualquer hesitação, a Alemanha. Desde logo, pela sua dependência do gás natural russo (basta pensarmos no gasoduto Nord Stream 1 e depois … o 2) e o modo como Berlim foi capaz de operar uma mudança extraordinária com custos evidentes na factura energética das suas indústrias.
Em relação à segunda, o destinatário principal é, sem dúvida, a China. Mesmo antes da pandemia de 2020 e da Guerra de 2022, as preocupações dos EUA e da UE com a dependência em alguns sectores chave das suas economias face à China já eram bem visíveis. Seja em relação às terras raras, ao lítio, ao cobalto, à grafite, ao magnésio e ao níquel (cruciais no âmbito da “economia verde” e “economia digital” da UE), seja em relação à localização da “fábrica do mundo” de produtos mais quotidianos como máscaras de protecção (mais ainda com a pandemia) ou telemóveis. Em 2023, a rivalidade entre os EUA e a China faz parte da sociedade internacional e, nesse sentido, pensar que podemos voltar atrás é, sinceramente, pura fantasia.
O percurso feito pela UE é igualmente relevante e corresponde aos problemas sentidos por muitas empresas no mercado chinês. Há muitas questões e queixas, mas talvez a mais crucial e frequente seja a da reciprocidade (ou falta dela). Por exemplo, em um mesmo sector, uma empresa chinesa pode concorrer e comprar na Europa, mas o mesmo não sucede na China nas quais é necessário um parceiro local ou há limites estabelecidos pelo governo. Há igualmente sectores nos quais empresas europeias (ou estrangeiras) não podem entrar na China. A proposta da actual Comissão Europeia de “mitigar os riscos” vai ao encontro dessas preocupações e é interessante vermos como esta foi consensualizada no G7, em detrimento do mais abrangente e rápido “de-coupling”, preferido pelos EUA.
Perante estas duas fotografias o que podem fazer as empresas de retalho e de distribuição? Em termos gerais, tentarem “encaixar” os seus fornecedores na logica de diversificação a nível mundial e, por outro lado, pensar em produtores mais locais. Os sectores são muito diferentes entre si, mas a tendência a nível europeu é, cada vez mais, uma certeza. Há riscos geopolíticos que passaram (ou melhor regressaram) a fazer parte dos cálculos em termos de investimento e de fornecedores. Um dos muitos exemplos a nível mundial é a aposta da Apple e o início da “passagem” do mercado chinês para o indiano.
Por último, os gestores têm de estar mais atentos ao que se passa em Bruxelas e em Washington. Portugal faz parte da UE, de onde nos chega a maioria da nossa legislação. Pensar que Portugal está distante destas rivalidades entre grandes potências e que podemos passar pelos pingos da chuva sem nos molharmos é ilusório. Mais ainda, é uma ilusão perigosa. Acresce o rumo verde e digital das nossas economias e do nosso modo de vida, que nos toca a todos. A época de considerar a economia “apenas” como “económica”, ou seja, sem dimensões políticas ou mesmo estratégicas acabou com a pandemia e foi definitivamente enterrada no dia 24 de fevereiro de 2022.
Raquel Vaz Pinto
Por opção da autora este texto não segue o Acordo Ortográfico.
Fonte: Store Magazine